Davide Ancelotti, pressão e o desafio da estabilidade no Botafogo

Davide Ancelotti, pressão e o desafio da estabilidade no Botafogo
Vítor Silva/Botafogo

De algumas semanas para cá, o processo de fritura do Davide Ancelotti foi iniciado no Botafogo. Desde então, vários pontos negativos estão sendo levantados e poucos positivos ou “descontos” colocados como contraponto. Muitos defendem a troca imediata, motivados por alguns resultados bastante ruins (como a eliminação para o Vasco na Copa do Brasil, por exemplo). Outros não gostam do perfil dele à beira do campo. Há também quem ache que ele não tem capacidade de estudar adversários, e por aí vai.

Por outro lado, há quem defenda que críticas mais contundentes não devam ser feitas ao nosso técnico. Argumenta-se que ele não tem culpa pela montagem do elenco não ter sido tão acertada quanto em 2024, que ainda está aprendendo a ser treinador principal e não mais auxiliar, que não teve tempo para treinar, entre outros pontos.

Pois bem, muitos já devem imaginar qual é a minha opinião sobre esse assunto. Isso se deve a algo que está em falta no Botafogo: continuidade e coerência. Defendo desde sempre que seja dada estabilidade aos técnicos e só faço coro aos gritos por demissão em ultimíssimo caso. Tenho plena noção de que mudanças podem ser benéficas e até inevitáveis, mas, na maioria das vezes, a troca de comando ou mantém o clube no mesmo nível de aproveitamento, ou piora a situação. O Davide, por exemplo, tem um aproveitamento muito similar ao do Renato Paiva.

A cultura da demissão precoce é muito forte no Brasil, e grande parte desse cenário foi alimentado pela imprensa e pelo não combate à ideia de que o torcedor pode agir 100% pela emoção em tudo que envolve futebol.

No Brasil, a cultura futebolística privilegia o resultado acima de qualquer outra coisa. Na minha visão, isso empobrece o debate e, pior, influencia na deterioração da capacidade do futebol brasileiro ser mais forte, tanto na formação quanto na competição em nível mundial. Muito se fala sobre a falta de técnicos competentes no Brasil. Mas será que analistas e torcedores param para pensar que os estímulos do nosso ambiente futebolístico fazem com que treinadores foquem apenas em se manter no cargo? E que, para isso, eles sabem que só vencer – independentemente da forma — garante a sobrevivência?

Não existe espaço no Brasil para que novas ideias sejam testadas, para que jovens treinadores se desenvolvam (brasileiros ou estrangeiros), para que a base seja realmente usada para lapidar talentos, para que a criatividade floresça. Vivemos numa eterna análise da tabela de classificação, e essa é a verdade. O futebol brasileiro privilegia a covardia, o conservadorismo e a superficialidade nas analises.

Dentro desse contexto, fica ainda mais complicado analisar a situação do Davide. As decisões equivocadas de Textor e do departamento de futebol colocaram o Botafogo em um cenário em que a pressão pela vitória é ainda maior. Não podemos, de maneira alguma, ficar fora da próxima Libertadores e, por consequência, da Copa do Brasil. Essa pressão fortíssima faz com que a paciência (já extremamente limitada) da torcida fique ainda menor. O resultado é que cada erro do Davide pode acabar reverberando de forma desproporcional, e o lado passional do torcedor pode acabar assumindo o protagonismo.

Dito isso, é preciso reconhecer também que o outro extremo existe, e é tão ruim quanto. Achar que o Davide não pode ser criticado é equivocado. O correto é que as críticas sejam feitas com base na realidade e de forma justa, não que deixem de existir. O Davide tem tido, sim, dificuldades de leitura de jogo e de adaptação ao calendário brasileiro. Como não pontuar fatores que custaram pontos e classificações? A crítica é parte importantíssima na evolução, não podemos negligenciar esse aspecto.

Em resumo, o Davide não mostrou apenas pontos ruins. Ele já conseguiu fazer o Botafogo ter excelentes momentos em campo. Ou seja, a qualidade para um bom trabalho existe tanto nele quanto nos jogadores. O que falta é que o Botafogo use todas as ferramentas possíveis para dar estabilidade ao processo e, assim, buscar a tão sonhada regularidade em performance e resultados.

Nosso treinador não me parece ruim nem uma aposta furada. Muito provavelmente, apenas foi contratado no momento inoportuno. Mas, agora que já estamos em meio ao processo, o caminho é insistir até que não seja mais possível vislumbrar um horizonte positivo.

P.S.: É sempre necessário fazer avaliações profundas de cada jogo, para que possamos reagir de maneira mais enérgica no futuro, se necessário, caso a classificação para a Libertadores esteja em risco iminente.
Comentários