O Botafogo de 2023 tem lições valiosas para dar ao de 2024

O Botafogo de 2023 tem lições valiosas para dar ao de 2024
Vitor Silva/Botafogo

Enfim, chegamos ao final de 2023, um ano marcado por uma decepção final gigantesca, mas ao mesmo tempo, um ano que pode significar uma virada de chave para o Botafogo e sua torcida. Não é segredo que o Botafogo está passando por um profundo processo de reorganização, assim como não é segredo que todo processo desse tipo normalmente é construído através de avanços e eventuais falhas ou fracassos. Obviamente, o clube precisa “se libertar” de maneira definitiva do final trágico da última temporada, mas é tão importante quanto fazer uma profunda reflexão sobre o que deu certo e o que não deu certo, pois assim iremos usar o fiasco como uma fonte muito importante de aprendizado.

Podemos começar dizendo que esse final de temporada nos mostrou o tamanho da importância que o aspecto mental possui no futebol moderno de alto nível. Eu espero que o Botafogo realize um intenso trabalho no campo da psicologia do esporte, pois não se trata de algo de menor importância como muitos ainda pensam. Ao longo de todo o Campeonato Brasileiro, vimos Abel Ferreira aumentar a carga psicológica do Botafogo através de declarações que nos colocavam como campeões brasileiros ou, no mínimo, como super favorito. Abel sabe exatamente o peso psicológico gigantesco que é estar brigando pelo título de um campeonato tão disputado, e mais do que isso, ele sabia que o Botafogo não estava acostumado a viver essa pressão. O departamento de futebol precisa ter como uma de suas prioridades o fortalecimento do aspecto mental de um elenco que terá em 2024 uma quantidade significativa de remanescentes da temporada que mais recentemente se encerrou. Será preciso trabalhar o lado psicológico desses atletas para que toda a força seja colocada não no que passou, mas naquilo que deve ser feito para curar essa ferida que ficou aberta.

É preciso destacar também a necessidade de estarmos muito atentos ao aspecto físico do time, pois esse foi claramente um ponto de desequilíbrio negativo na fase derradeira da temporada 2023. O Botafogo precisa continuar investindo de maneira forte e contínua na melhoria da estrutura oferecida aos profissionais do núcleo de saúde. Um elenco que possui um bom número de jogadores-chave acima dos trinta anos precisa ter muita atenção, principalmente no trabalho de manutenção e recuperação pós-jogos. Obviamente que as várias trocas de comando realizadas na última temporada impactaram negativamente na forma física final do elenco, e também por isso, o clube precisa buscar soluções para minimizar impacto semelhante caso tenhamos que realizar alguma troca de comando ao longo de 2024 (espero que não precisemos!).

Falando em elenco, creio que o grande objetivo deve ser manter a maior parte dele, mas tendo muito cuidado na análise sobre o impacto de cada manutenção. Temos vários bons jogadores que não deixaram de saber jogar futebol, mas é preciso ter a consciência de que precisamos trazer novos atletas que elevem o nível do nosso time titular, eventualmente colocando alguns bons remanescentes no banco de reservas. Futebol não se faz com a noção de “terra arrasada”, ainda mais quando estamos falando de um grupo de jogadores que fez o melhor primeiro turno da história do nosso campeonato de pontos corridos. É preciso equilibrar a paixão e a emoção, pois só assim conseguiremos estar mais perto de decisões assertivas e equilibradas.

É impossível fazer uma reflexão sobre 2023 sem falar na atuação do departamento de futebol. Quem me acompanha por aqui, no X ou no Fala Fogão, sabe que tento sempre ter muito cuidado ao falar sobre o trabalho de André Mazzuco, pois creio que nos falta conhecimento de várias informações cruciais para que uma análise definitiva e profunda seja realizada. Minha principal crítica ao trabalho dele reside na minha sensação de que ele se omitiu em vários momentos de crise. Vocês vão lembrar daquele período de pressão extrema durante o último Campeonato Carioca, no qual o único profissional do clube que se colocava diante da imprensa/torcida era o Castro, assim como vocês também irão se lembrar da reta final do último Brasileirão, onde toda tentativa de explicação para os seguidos vexames foi dada apenas pelos técnicos. A impressão que me dá é que todo o profissional que assume o comando técnico do Botafogo também assume a responsabilidade de falar em nome do departamento de futebol, e isso é um equívoco gigantesco. Já que a permanência do Mazzuco foi garantida através da renovação do seu contrato, eu espero que em 2024 ele tenha uma postura diferente. Se toda essa omissão ocorreu por uma falta de autonomia para falar em nome do departamento, fica muito clara a necessidade de Textor rever essa questão.

Falando em Textor, creio que alguns pontos precisam ser comentados a respeito da maneira como ele conduziu o nosso futebol. Me parece ser possível afirmar que John possui um perfil bastante centralizador, o que até certo ponto é natural pela maneira como ele encara o investimento e o projeto da Eagle Holdings. Não estamos falando de um investidor que apenas despeja recursos em um projeto e que se coloca na posição de somente analisar relatórios sobre o andamento dos seus investimentos. Textor se envolve diretamente na operação dos seus clubes e exerce um papel de guardião da sua visão sobre como e para onde os projetos devem caminhar. Tendo esse perfil, é absolutamente esperado que ele participe ativamente em decisões-chave do dia a dia do Botafogo, mas será que ele já possui todo o conhecimento necessário sobre como funciona o futebol brasileiro e, em especial, sobre quem é o Botafogo? Muito provavelmente a resposta é não. Ao longo principalmente da reta final do Brasileirão, ficou bastante claro que ele tomou decisões que alguém com conhecimento profundo do nosso futebol e também do que é o Botafogo, não tomaria sob nenhuma hipótese. Colocar Lúcio Flávio como técnico efetivo no momento mais importante do clube em décadas foi um erro tão crasso quanto amplamente evitável, para ficar somente no maior dos exemplos dos erros cometidos.

Ao falar sobre a maneira como Textor conduz o Botafogo, eu gostaria de compartilhar com vocês a maior das minhas preocupações. Por ter comprado noventa por cento das ações da nossa SAF, John tem o controle absoluto do nosso futebol e por isso acaba tomando de maneira exclusiva as decisões mais determinantes sobre o caminho que o clube deve seguir. Ao acompanhar tudo que aconteceu no Botafogo esse ano, eu fiquei com a sensação de que não existem vozes dentro da SAF capazes de fazer contrapontos aos desejos do Textor. Me preocupa muito imaginar que o líder maior do meu time talvez não abra espaço para que ele seja internamente questionado. Está longe de ser saudável uma liderança na qual a vontade do líder possa ser inquestionável, ainda mais em um contexto no qual esse líder não domina de maneira inequívoca o ambiente. Por isso, espero sinceramente que no ano de 2024 a gente possa ver um Textor com ouvidos mais atentos e apurados, sempre lembrando que não é para sair escutando todo mundo a todo momento, é preciso identificar os momentos oportunos e as vozes corretas. Não tenho dúvida de que, através do modo empírico da tentativa e erro, o John aprendeu valiosas lições nessa segunda temporada à frente do Botafogo, mas é preciso abrir um espaço maior para que exista um equilíbrio entre autoridade, flexibilidade e o ato de delegar.

Toda virada de ano acaba sendo um momento em que nós mentalizamos coisas boas para o próximo ciclo, e é exatamente isso que estou fazendo com relação ao Botafogo. Precisamos levar para 2024 todos os ensinamentos oriundos das alegrias e das decepções que tivemos em 2023. Ninguém disse que o nosso caminho seria fácil, mas para a sorte do nosso Glorioso, nós nunca iremos abandoná-lo. Ainda temos muito trabalho pela frente, mas em linhas gerais estamos em um bom caminho para chegarmos onde sonhamos e merecemos. Já estou ansioso para ver o Botafogo em campo novamente!

Vejo vocês em 2024, irmãos!

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