Em 279 a.C., o rei Pirro e seu exército enfrentaram os romanos na Batalha de Ásculo. Após a vitória, o rei observou seus soldados comemorando e afirmou: “Mais uma vitória como essa e estamos arruinados.” Nessa batalha, o rei perdeu seus principais generais, responsáveis por formar novos recrutas, além de uma grande parte de seu contingente. Seus principais aliados estavam recuando, enquanto o exército romano possuía uma grande capacidade de reagrupamento e recrutamento. A expressão “vitória de Pirro” reflete uma conquista cujas perdas são insustentáveis e os danos não se compensam.
Pedro Martins, o novo diretor de futebol do Botafogo, destacou em sua entrevista coletiva de apresentação que o principal diferencial que encontrou no Botafogo foram os processos estruturais sendo construídos sobre bases sólidas, para sempre lutar por títulos. E isso requer tempo, ano após ano. No Brasil, tudo é para ontem.
Em 1979, Bill Walsh chegou ao San Francisco 49ers com a missão de reestruturar um time completamente disfuncional à época. Seu caminho para a vitória era baseado na cultura esportiva que ele queria criar. Seu lema era “The Score Takes Care of Itself” (o placar toma conta de si). Ele tratava o resultado como um subproduto, onde o mais importante era fazer as coisas certas dentro de uma cultura a ser criada. O resultado surgia naturalmente. O 49ers tornou-se o time mais vencedor da NFL naquela era.
Diversos outros esportes passaram a beber dessa fonte. Talvez o caso mais famoso no futebol seja o de Ferran Soriano, ex-Barcelona, atualmente no Manchester City. Soriano escreveu o livro “A Bola Não Entra por Acaso”, em que aborda essencialmente como processos bem fundamentados e sólidos conduzem ao resultado.
O Botafogo vem se fortalecendo ano após ano. A cada temporada, vemos um elenco mais forte, desenvolvimento de estrutura de futebol e corporativa. Hoje, os jogadores fazem lobby para renovar seus contratos, em vez de forçar a saída. O elenco deste ano não é o melhor dos últimos 10 anos, tem de ser o pior dos próximos 10. A estrutura deste ano não é a melhor dos últimos anos, tem de ser a pior dos próximos 05. A receita, os profissionais etc. Ano após ano, entre erros e acertos, estamos crescendo para não retroceder.
Hoje, o futebol deve ser encarado de forma profissional, e quem não se adaptar ficará anos atrás. Projetos esportivos são essenciais com uma visão de médio a longo prazo. O Botafogo não pode se dar ao luxo de buscar vitórias a qualquer custo com danos imensuráveis. Essa fase já passou e, não me interpretem mal, tentamos dessa forma várias vezes, mas não tivemos competência para vencer a qualquer preço. Ficamos apenas com as perdas, sem conquistar vitórias significativas.
Escrevo este texto antes dos jogos decisivos das copas para não parecer que estou surfando em vitórias ou justificando algo. A sensação de todos é que cada vez estamos mais próximos do nosso lugar de direito, voltando a ser protagonistas, não por acaso, mas por trabalho sério, começando do zero. E quando ganharmos (iremos!), voltaremos no ano seguinte para ganhar mais uma vez. Nossa vitória chegará e não será “pírrica”.