Sabia que John Textor às vezes dobra os bichos dos jogadores por vitórias? Que Marlon Freitas mobilizou a casa de um funcionário do Botafogo? Que Alex Telles jogou uma partida no sacrifício quase sem unha? Que Gregore podia pedir para sair se o clube não fosse campeão da Libertadores? Em entrevista ao “Toca e Sai Podcast”, o fisioterapeuta Fabio Azevedo contou essa e outras histórias de bastidores.
Leia abaixo:
Título da Libertadores em 2024
– Porra, me emociona, assim, falar de 2024. Chegar na Seleção é legal, mas eu acho que bater Libertadores para mim foi mais significativo. Porque eu estou no Botafogo há muito tempo, então eu estou vendo aquela coisa, alguns meses de salário atrasado, isso numa época bem sombria. Então a gente vê evolução, compra de equipamentos, a direção acreditando no serviço, não medindo esforços, e você vê que vai bater alguma coisa legal. Aí a gente chega no topo. Hoje, qualquer coisa que fale sobre Libertadores do Botafogo, qualquer trecho de vídeo de Instagram que eu vejo, cara, eu me emociono. E eu pude levar meu filho pra final, meu filho tem 11 anos, botafoguense, Joãozinho. Queria ter levado a Joana, que é minha filha também, tem 15 anos, mas ela não quis ir, não pôde ir por conta de colégio. Mas ele foi, foi meu irmão também. Eu nunca tive tatuagem, eu fiz uma. Botei a taça da Libertadores e do Brasileiro no meu tornozelo. Eu acho que é uma coisa realmente marcante pra quem trabalha no esporte, eu imagino pra quem esteve ali jogando, sabe? A emoção dos caras comemorando, saindo correndo, o Igor Jesus mordendo o colete, olhando pra cima, não acreditando, o Marlon indo no vestiário, perguntando a Jesus Cristo, a Deus, se ele merecia aquilo ali. E ele sabe que merecia. O grupo merecia. O próprio Gregore, cara. Então… Por 40 segundos ali, aquele estádio… Nenhum estádio de final de Libertadores esteve como esse. O Botafogo fechou a Argentina, cara. Fechou a Argentina, não tinha como. Avião, voos, não tinha mais voo. Pessoal indo de carro, pessoal indo de ônibus, cara, foi a maior final de Libertadores dos últimos tempos. E a gente estava muito confiante, cara. Os atletas estavam. Assim, tranquilidade. Andando, assim, pareciam que iam jogar uma partida muito normal.
Expulsão de Gregore
– Aquela expulsão ali, engraçado que não abalou. Não abalou, cara. Abalou o Gregore. Eu acho que abalou. Porque na resenha com a gente ele falou “cara, se a gente perde, eu ia pedir para ir embora e tal”. Mas… Assim, você viu que não abalou, cara. A gente jogou de igual para igual. Mas ele é um cara que eu tenho muito respeito por ser exemplo dentro do clube. O Gregore é um cara top de lidar. É um cara verdadeiro, fala olhando no seu olho. O cara gosta de trabalhar, gosta de trabalhar mesmo e joga bola demais.
Certeza do título
– Foi no jogo com o Palmeiras. Porra. Aquele discurso do Marlon ali, eu comecei a chorar na roda. Quando eu fiz assim, a lágrima desceu. Ele começou a falar “meu irmão, tinha que ser aqui, porra”. Porque Palmeiras, que foi um dos responsáveis por abalar nosso time na temporada anterior. Teve uma série de elementos, mas o Palmeiras estava na linha. Então, ele desabafou. Ele falou, “cara, tem que ser aqui. Tinha que ser aqui. Vamos lá, porra. Vamos mostrar que é nossa hora”. Aí, depois, no outro dia, ele me segurou e falou “porra, te fiz chorar, hein? Cara, solta, pode soltar”. Eu falei, “porra, meu irmão, o que é isso, cara?” Foi dentro do coração de geral, meu irmão. Do Rafael, porra. Que isso, o Rafa… Porra. Carreira internacional, indiscutível, cara botafoguense.
Premiações de John Textor
– Ele já dobrou o prêmio algumas vezes. Durante os jogos da trajetória, em jogos que a gente, não é que mereceu o prêmio, mas mereceu realmente a vitória. E aí, o Alessandro (Brito), que é o nosso diretor hoje, falava com ele na hora. Pessoal, está dobrado o prêmio”. E ele, em alguns jogos que ele já foi, já chegou lá na roda e disse “hoje foi fogo, porra. Bicho dobrado”. O cara é nosso, cara. É isso. Ele chega ali e vai conversar com você. Ele chega lá na barraquinha de cachorro-quente, pega o latão dele, cerveja, bebe… Ele é do povo, é um cara acessível. Chega, fala com todos os funcionários. Tem uma relação boa com todo mundo. Sensacional.
Recuperação de Júnior Santos
– Ele teve uma fratura, tinha um prognóstico avançado pra um pouco mais de tempo. A gente conseguiu, junto com o departamento médico, todo o núcleo de saúde, que não é só fisioterapia, não é só medicina, não é só nutrição, não é só psicologia. A gente se une, não é só fisiologia. A gente se une pra poder ir em prol do jogador. Cara, foi um dos trabalhos mais bacanas que eu já fiz como fisioterapeuta. Então, a gente conseguiu recuperá-lo em, pô, metade do tempo. Ele conseguiu ir pra Libertadores e fazer o gol. Olha só. Aí ele falou “porra, cara, se eu fizer um gol, eu vou lá e vou te dar um abraço”. Não foi (risos). É aceitável, natural. É compreensível, né? O que passa na cabeça do cara, meu irmão? Pô, fez aquele gol, cara. Coroando um trabalho bacana da gente, todo o núcleo de saúde do clube. E é um cara também persistente, predestinado às coisas darem certo com ele. Um cara que é religioso pra caramba. Tudo que ele faz, ele coloca a Deus na meio. Eu acho isso maneiro. É legal. Você se apega, né, cara?
Superação de Alex Telles
– O Alex Telles eu sempre brincava com ele, eu sempre falava “pô, cara, eu não acredito muito em você. Não acredito muito em você. Não acho que você é um jogador bom pra caramba” (risos). Eu sempre falava com ele isso, meio que na brincadeira e tal. Mas, cara, eu vi ele voltando pra um jogo. Assim, o cara tomou um pisão no pé e a unha dele caiu, estava caindo. Qualquer jogador certamente sairia, ele falou “não, eu vou voltar”. Eu acho que foi um jogo contra o Flamengo, cara. Ele falou “não, eu vou voltar”. Falei “caralho, que isso, cara?”. Voltou, arrebentou, jogou pra caralho. No outro dia, ele apareceu no DM, eu falei “você é meu jogador. Porra, cara, agora eu te admiro”. Não é qualquer jogador que faz aquilo ali, sabe? E não é porque tá jogando contra o Flamengo. É porque o cara quer ganhar, quer estar. A unha do cara tava caindo, o dedo tava esfolado. O pé esquerdo dele, o pé que ele usa todo momento em cruzamento. Aí ele me ganhou. E o Alex, cara, é piada. Nível absurdo. Nível tanto intelectual, cognitivo, tudo que você explica pra ele, tudo que você conversa com ele é alto nível. E tecnicamente, né? Bom demais.
Volta de Marçal
– Aliás, todo mundo do clube, cara, assim, jogadores, é um grupo que, como eu queria que o Rafa tivesse de volta, pessoas que saíram, o Almada, quietinho, chegava pra treinar, cabeça baixa, não falava com quase ninguém, só bom dia, boa tarde. Cada um com sua característica. Mas, pô, o Marçal voltou, vibrei pra caramba. Um dia antes do Marçal voltar, olha só que coisa. Peguei o celular, aí tem lá dentro agora do CT as fotos, os banners, as pessoas comemorando, os atletas. E tinha lá um do Marçal. Aí, no aniversário dele, eu filmei assim, “Marçal, tá aqui, cara, você entrou pra história. Olha aí, feliz aniversário, mas, pô, que pena que você não tá aqui com a gente”. Ele me respondeu “pô, legal, tal, obrigado e tal”. Filho da mãe, ele já sabia. No outro dia ele apareceu, cara. Ele “pô, eu não apaguei aquele vídeo, não, não sei o quê”. Marçal é o líder.
Generosidade de Marlon Freitas
– Tem jogador, por exemplo, eu acho que eu posso falar porque é um cara que que… Coisas boas eu acho que a gente pode falar. O Marlon, meu irmão, porra, até me emociono. O Marlon chegou para um funcionário lá, o cara estava mudando, fazendo a mudança, ele mobiliou a casa do cara toda, meu irmão. Caramba. Entendeu? Isso não vaza, isso não sai. Olha o coração do cara, meu irmão. Vê o que um cara que está ali com a gente trabalhando está precisando “vambora, vamo, vamo”. E eu sei de coisa, assim, de muita gente que ajuda as pessoas mesmo sem pedir, algumas precisando. Pode ser que eu tome uma dura manhã dele e ele fale “porra, meu, não faz essas coisas, não”. Mas é coisa boa, cara.
Trabalho de recuperação
– Dificilmente você vai ter um DM vazio, vazio. A gente tem um hoje, a gente está fazendo um trabalho com o Danilo (Barbosa). Mas, assim, quando está vazio por muito tempo, você, tem que perguntar por que está vazio por muito tempo. A gente faz trabalho de preventivo. Nossa, eu me orgulho do trabalho preventivo que a gente faz. Eu me orgulho. A gente faz 30 atendimentos por dia. Depois do treino, a gente pega os caras, leva pro DM, trabalha o cara, limpa o cara, martelinho de ouro, e deixa o cara em melhores condições pro outro dia. O gelo é o seguinte, tem muita gente, tem muito atleta que não gosta até fazer. Pô, a evidência clínica é imediata, cara. O cara faz. Tchê Tchê era um cara que não fazia, sentia, não gostava e tal, ele aderiu. Aí fez. “Pô, meu irmão, negócio bom, hein, cara”. Aí não machucou nenhuma vez.
– Todos os caras são muito queridos, assim. Bastos, um cara que é extremamente exigente também. Bastos está voltando agora, está treinando. Extremamente exigente, a gente toma conta do cara, né? Então, pô, tem muito atleta que precisa desse cuidado. Os atletas com uma idade um pouco mais avançada, a gente fica mais próximo. Pra não deixar o cara quebrar. E é o que acontece, pô. Você vê, muitos atletas mais velhos não quebram, porque a gente fica em cima. Pega o cara no braço, leva lá pro DM, trata dele.
Volta de Gatito Fernández
– Muita gente queria até aposentar ele, né? O Gatito eu tenho como um ídolo. Toda torcida tem. Ele precisava de um trabalho também diferente, porque, pela idade, não é um cara velho, mas também não é um cara novo. E o goleiro, geralmente o goleiro, tem uma aquisição maior, assim, por causa das quedas, treinamento a todo momento ali. É o primeiro a ir no campo, é o último a sair. Todas as lesões do Gatito foram ruins. Cotovelo, punho, ombro, joelho. Deram trabalho. Mas hoje ele está aí. Está feliz, a gente se fala. Eu acho que ele ainda volta pro Botafogo um dia. “Ah, não sei”. Falei, “ó, rapaz, tua vida é aqui. Vem pra cá”.
Botafogo ter poupado jogadores na Copa Intercontinental contra o Pachuca
– Nessa ocasião, foi única, exclusivamente, decisão técnica. Ele (Artur Jorge) achava que alguns jogadores estavam muito desgastados pela viagem. A viagem não foi boa por conta do fuso horário, por conta da distância. Então, a gente tinha jogado um dia e meio atrás, um dia atrás, tínhamos sido campeões e comemoramos, porque precisava comemorar. Pô, imagina. Deu pra extravasar. Foi muito bacana. A gente comemorou lá (no Estádio Nilton Santos), tem uma área exclusiva, pra sócio, uma área bacana. Teve samba, teve mesmo comemoração bacana. Dali tomamos banho e viajamos. Não foi o desgaste, lógico, pela comemoração. Não precisa nem eu falar isso. Foi pela situação mesmo da viagem, do jogo. Então, ele optou. E a gente achava que pudéssemos ter bons resultados.
– Cara, o Barboza é um maluco do bem, cara. Ele é um cara do bem. O Artur teve a capacidade de colocar ele no eixo. E foi uma coisa incrível, né? Que o Barboza saiu daquela situação dele de início do clube ali que é aquela coisa de louco, aquele zagueirão mesmo e tal, virou um cara clássico. Referência na qualidade. Referência na posição. Até citado em relação a seleção no país dele. E aí a gente tem que dar muito crédito ao Artur que conseguiu isso. Mas ele é um cara maluco do bem. Chega lá todo dia no DM, abraça todo mundo. Brinca, xinga pra caramba os caras (risos). Os outros fisioterapeutas, xinga. Traz alfajor pra gente. “Aí, você me dá um moral, eu dou moral”.
Saída de Tiquinho Soares
– Cara, o Tiquinho passou um ano muito difícil por conta do pai dele. O Tiquinho é um dos jogadores mais inteligentes que eu já vi. É muito acima da média. Se você vê um jogo do Tiquinho hoje, não muda nada, assim, do jogo dele, mas todos os toques do Tiquinho são toques diferentes. Pode perceber. Eu já tinha falado isso pra ele uma vez. Eu falei “cara, é impressionante. Tudo que você faz é diferente”. Se ele faz um pivô, é diferente. Se ele toca de lado, é diferente. Se ele dá um drible, é diferente. Tudo é diferente dele. Se o cara é diferente em tudo, ele é craque. É craque. Simplesmente. Porque ele passou um ano muito difícil. Eu não queria que ele tivesse saído do Botafogo. Estou falando como torcedor. Eu não queria. Porra, eu também não queria que o Gatito saísse. Só que a gente vê… Todas as pessoas precisam e merecem ser felizes. Ele estava um pouco, assim, ferido pelo ano que tinha passado em 2023. Ganhou em 2024. Mas estava ainda um pouco ferido. Eu vi uma comemoração dele no Santos, num gol no Santos. Ele deu um sorriso pra câmera que eu não via esse sorriso há muito tempo. Então eu falei, pô, cara. Merece, pô. Todo mundo merece ser feliz.
Noção do que o Botafogo fez
– Temos, cara. A gente entrou pra história, né? Essa que é a realidade. Quando a gente entra no CT, a gente vê nossas fotos lá, vibrando no pódio. Mas não é porque entramos pra história que a gente vai afrouxar. A gente quer mais, cara. A gente quer mais. A gente está trabalhando muito. Isso eu falo pros torcedores do Botafogo. A gente está trabalhando muito. Eu falo a gente, o Botafogo, com a direção. Você vê que tudo é escolhido a dedo, alimentação, você chega no clube e tem um restaurante. Tem atletas que querem levar comida pra casa. Eu já viajei o mundo inteiro por conta do futebol. O Botafogo está no top 3. Fácil. E é o que os jogadores falam. De alimentação, estrutura, equipamentos. Qual equipamento que a gente não tem? Nenhum. Você nem pede, os caras mandam. Eles mandam, eles compram. Temos uma gerência de alto nível. Isso é fruto de escolher realmente as pessoas que podem dar um resultado melhor pro Botafogo. Então é isso, cara. E a gente espera que aconteça coisas boas.