Técnico do Botafogo no título da Série B em 2021, Enderson Moreira foi um dos grandes responsáveis do início da volta por cima do Glorioso. Ele pegou o clube próximo da zona de rebaixamento e conquistou o acesso.
Em entrevista ao “Charla Podcast”, Enderson, hoje treinador do Novorizontino, recordou o período com orgulho e gratidão.
– A gente estava em 14º, né? Eram 12 rodadas, estava em 14º lugar. E é engraçado porque parecia um roteiro de filme. E, na verdade, teve uma série, um filme, o “Acesso Total”. E é engraçado porque a gente sai de uma situação extremamente complicada e consegue chegar ao título. A Série B, para mim, é uma competição que você tem quatro campeões. Ninguém comemora menos do que o campeão. O quarto colocado comemora tanto quanto, até mais, às vezes. Mas, assim, você sair dessa 14ª colocação e conseguir chegar ali no título foi uma coisa muito importante que eu me orgulho. Eu sei que tem muita gente que fala assim, “ah, mas Série B não é orgulho pra ninguém”. Mas vencer uma competição é sempre muito difícil, né? E ali o Botafogo era muito importante pelos próximos passos que foram dados e que estavam já sendo planejados, porque o terreno ficou mais fértil. Para poder vir um investidor e tentar resgatar tudo aquilo que a gente sabe da história do Botafogo – contou.
Enderson Moreira respondeu ainda se sonha em voltar ao Botafogo um dia.
– Eu tenho um carinho enorme pelo Botafogo que eu não vejo um convite do Botafogo como um convite, eu sempre vou ver como um chamado, entendeu? Pela minha relação, assim, com o clube, com os torcedores. Então, não é que é seja um sonho, mas eu vou estar sempre preparado pra qualquer momento que houver esse chamado aqui para poder ajudar – explicou.
Leia outras respostas:
Importância de Joel Carli
– Eu tinha uma admiração enorme por um jogador que não estava, assim, muito dentro do processo, que era o Carli. Ele não estava afastado, mas ele não estava ali dentro da equipe, talvez. E eu sempre fui muito admirador dele, assim. Porque eu sou de uma época que eu entendo futebol, assim, com grandes líderes, entendeu? Não é o cara que é capitão simplesmente porque ele é o melhor jogador. É o cara que é capitão porque ele detém o respeito de todos. Não é porque ele é o melhor, mas todo mundo olha para ele e fala assim, esse cara veste a camisa do clube, ele põe o grupo acima até dos próprios objetivos pessoais. Então, assim, eu sempre olhei e vi o Carli com aquela gana, aquela vontade de poder ali, comandar, de exigir de cada um o seu máximo. E ele sempre foi assim. Então, assim, eu cheguei e a primeira pergunta que eu fiz ao Eduardo Freeland foi se o Carli estava afastado. Ele falou que não. Eu disse que gostaria de colocar o Carli novamente na equipe. E aí, acho que esse foi o movimento, porque o Carli tinha muito respeito de todos.
Capitães
– A gente tinha praticamente três capitães ali. Era o Carli, o Kanu, que transitava entre os mais jovens, os mais experientes. O Kanu é aquele que vai transitar em todos os grupos ali. Fala com todo mundo, agrega. Então, os dois muito próximos. E o Ricardinho, que veio para poder jogar, experiente, não conseguiu jogar tanto assim, mas foi fundamental. O Ricardinho teve um papel ali fundamental. E a gente tinha jogadores experientes, Rafael Moura, o Cavalieri esteve ali no começo, o Cavalieri esteve no começo, depois saiu. E uma meninada querendo surgir, querendo buscar seu espaço. O Chay, que era um jogador que tinha, recentemente, saído de um fut7 para poder ter oportunidade no profissional. Então, assim, a gente pegou muita gente querendo realmente fazer a coisa acontecer. E aí, acho que esse primeiro movimento foi muito positivo. A gente conseguiu unir cada vez mais. E, claro, resultado positivo vai gerando mais confiança. Todo mundo começou a acreditar até que a coisa aconteceu.
E se Carli não voltasse ao time?
– Eu acho que não ia subir. É porque hoje, acima de tudo, a gente é muito carente dos líderes, entendeu? Faz muita diferença. Concentra todo mundo nele. Isso acontece. Hoje, cada um está no seu quadrado, entendeu? Então, é o seguinte. Eu não quero que ninguém invada aqui, mas eu também não vou invadir de ninguém. Muitas vezes os jogadores hoje não se cobram mais. E eu sou de uma época que a gente se cobrava, né? Eu não fui atleta profissional, joguei só até 18 anos, nem base, assim. Mas a minha época era a época de vestiário de a gente pôr a mão na cara do outro e cobrar, porque não é assim que faz. E hoje em dia, assim, isso é muito raro. A gente está caminhando, a gente fica buscando alguém que tenha um perfil e, às vezes, a gente não encontra. Hoje é raro aquele que se põe acima, põe a equipe acima de qualquer visão individual, entendeu? É raro. E aí nós começamos e os caras foram comprando e, de repente, a gente, por fim, encaixou a equipe. A equipe começou a produzir muito e o Carli foi determinante porque ele, dentro de campo, era o cara que ia ali e cobrava dos caras para poderem fazer aquilo que estava combinado.
Chay e Rafael Navarro
– O Chay fez uma grande temporada, né? Porque a qualidade dele também, ele era um meia-meia mesmo, assim. E eu sempre gostei muito de jogar com centroavante e meia.
Minhas equipes todas têm um centroavante e um meia. Tinha os dois. Tinha o Navarro muito bem e o Chay, que produzia muito também.
Vasco 0 x 4 Botafogo
– O Fernando Diniz tem um jogo de posse. E, assim, quando você tenta rivalizar um pouquinho com ele, querer a posse, você vai se complicar. Então, em determinado momento, a posse vai ser deles. Agora, vamos ajustar bem a equipe. Vamos compactar bem, vamos estar bem próximas. E quando a gente roubar a bola, nós vamos mudar o corredor, mudar o lado. Não é falar corredor, mas é mudar o lado. Então, a bola estava aqui, a gente roubava, eles faziam uma pressão muito forte no cara da bola. Com jogadores, muitos jogadores. Muitos jogadores, porque ele concentra muitos jogadores ali. Ele perde, mas recupera rápido. E o que a gente preparou para esse momento foi a mudança de corredor. Então, a gente roubava, a gente não mantinha ali com dois, três passes. A gente mudava completamente o rumo. Roubou, vira o jogo. E o outro lado estava aberto. Foi onde a gente conseguiu escapar. E aí é tudo ajuda também. O momento do Vasco não era dos melhores. A pressão. A pressão da torcida. Aí os caras vão perdendo ali a confiança. E um jogador que foi muito importante nesse jogo foi o Marco Antônio, fez, assim, a mudança de corredor, e atacava espaço, fez um baita de um jogo.
Relação com a torcida e saída do Botafogo
– Eu acho que é a torcida que tem maior carinho comigo, assim. É mesmo. Nossa, o botafoguense comigo, assim. De vez em quando eu estou no aeroporto com alguma equipe e chega o cara “Poxa, cara, muito obrigado. Aquele ano foi importantíssimo pra gente”. E claro, né? A gente tinha muita vontade de dar uma sequência. De subir com o Botafogo, chegar a novos investimentos, você poder montar uma equipe ainda mais qualificada, mais forte. Claro que a gente pensou muito nessa possibilidade. Mas, assim, quando aconteceu a mudança (SAF de John Textor), também achei que era normal isso, entendeu. Eu só achei ruim de não ter sido comunicado. Isso eu achei ruim. Porque eu vou fazer um jogo contra o Fluminense. O Mário Bittencourt, que é o presidente do Fluminense, veio me abraçar. Falou “pô, Enderson, chateado por você e tal”. Falei “pô, chateado por quê?” Eu não estava sabendo. Ele (John Textor) anunciou antes para as pessoas da imprensa para depois me comunicar. É só esse detalhe. Agora, ele tinha todo o direito de fazer o que ele quisesse. Tirar todo mundo, fazer o que quisesse. Agora, é claro, se me perguntasse assim, tinha uma expectativa. É respeito mesmo, assim. Eu acho que não tem problema nenhum você mandar alguém embora, você tirar alguém do time, você fazer alguma mudança. O que você não pode perder é o respeito pela pessoa, né? De comunicá-la, de ser claro ali, olhar no olho e agradecer. E eu só tenho coisas boas pra poder falar do Botafogo. Não mancha em nada, assim, meu sentimento pelo Botafogo.
Ver o Botafogo campeão da Libertadores
– A gente fica muito feliz, né. Três anos só depois. A gente conviveu ali com o sofrimento, em um clube que estava beirando até a falência, em 14º lugar numa Série B. Você está perto ali da C. Imagina o que é isso. E você vê essa reviravolta, o respeito que os outros clubes passam a ter pelo Botafogo. O Botafogo podendo gritar é campeão, e com autoridade, né? Foi um campeão legítimo. Foi uma temporada muito boa.