Ex-oficial de integridade da CBF, Rômulo Meira Reis prestou depoimento na CPI da Manipulação de Jogos e Apostas Esportivas nesta terça-feira. Ele revelou um fato curioso que chamou atenção dos senadores. De 2017 a 2022, enviou mais de 200 alertas de suspeitas ao STJD, mas nunca foi chamado pelo órgão para esclarecimentos.
Leia trechos da conversa entre Rômulo Meira Reis e o senador Carlos Portinho abaixo.
Rômulo: O contrato da Sportradar assinado passava por mim; ou seja, o escopo contratual versus orçamento, entre outros, passava por mim. Então, nós tínhamos previsto, realmente, Séries A, B, C e D, não é? A C e a D, parcialmente – a Série C, também parcialmente -, e a Copa do Brasil, a partir das fases eliminatórias. Então, isso estava previsto em contrato. Dos alertas, normalmente, o oficial de integridade tem autonomia para realizar a análise. Não adianta receber um relatório, porque ele já vem com uma certa informação. Então, as análises geralmente são: aquela infração no mercado de apostas ocorreu em campo? Sim ou não? Caso não, automaticamente, é descartado; ou seja, algum apostador tentou alguma coisa ou movimentou um volume financeiro muito acima do normal e foi detectado, aquilo não aconteceu. O.k. Ocorreu em campo? De que maneira ocorreu em campo? Interferiu no resultado? Sim ou não? Caso tenha interferência, isso gera uma documentação, e a CBF encaminhava, na ocasião, para o STJD. De qualquer forma, todo e qualquer relatório que eu recebi na ocasião, além da análise técnica, era encaminhado para o STJD. Ao que acontecia dentro do STJD, processualmente, eu não tinha o acesso. Entretanto, por não ter o acesso, não significa que eu não estivesse disponível para prestar qualquer tipo de esclarecimento; diga-se de passagem, é um dos protocolos que eu preciso cumprir.
Rômulo: Até 2022, eu não fui chamado para nenhum tipo de esclarecimento referente aos relatórios. Então, somando aí aproximadamente cinco temporadas, devem ter passado pela minha mão mais de 200 relatórios.
Carlos Portinho: E, encaminhando… Eu sempre falei isso, o STJD não é uma instância do Judiciário, ele é um departamento da CBF, e isso ficou claro e estabelecido em decisão transitada em julgado da Corte Arbitral do Esporte, no leading case, no primeiro caso em que se discutiu isso, essa sua natureza jurídica, do ponto de vista nacional. Foi o caso Dodô, e que eu fui o advogado, inclusive, e eu sustentei a autonomia e a independência do tribunal e me conformei que há autonomia e há independência nas suas decisões. E, para alguns casos, a gente sabe que é relativo, porque ele é um órgão da CBF. E o STJD tem limitações, ele não tem poder de polícia, não é? Ele pode até intimar um terceiro, que, se ele não for da família do futebol, o cara nem vai. Aqui a gente ainda convoca abaixo de vara, o cara vai ter que pegar um habeas corpus; no STJD, se não for um agente, um “agente”, entre aspas, que não é um agente credenciado, que esteja envolvido, ele nem vai, ele não está nem aí. Então, ela tem limitações para essa investigação. O que a CBF disse, apenas aqui para deixar claro, é que, hoje, ela manda esses relatórios para o Ministério Público… o que, aliás – é por isso que eu quero aqui ouvir o Relator Mauro Marcelo -, na minha opinião, era o que ele deveria fazer, porque ele não tem instrumento de investigar; a gente tem mais do que ele aqui.
Carlos Portinho: Se eu quiser perguntar o nome dos atletas do clube em que houve a denúncia, se eles têm cadastro em casa de aposta, eu posso perguntar. E eles vão ter que me responder – as casas de apostas. O STJD? Dão de ombros para ele. Então, o que deveria… Por isso eu quero ouvir o Relator, para não ser injusto, mas o que deveria seguir o caminho de todas as 109 denúncias. Pega, manda para o Ministério Público, e, de preferência, o Procurador do STJD tenha a representação junto ao Ministério Público para acompanhar. Porque, quando – pelo menos nesse período que você relata, 2017 a 2022 – você mandava para o STJD, você foi chamado lá alguma vez para falar desses relatórios?
Rômulo: Não, não fui chamado. V. Exa. está bem correto. A associação-membro possui uma limitação de atuação. A própria FIFA prevê no código de ética. Se não me engano, o código da CBF também, o código de ética da CBF possui também. Você pode dar multas financeiras, suspensão e até a exclusão do desporto. Entretanto, conduzindo uma investigação com maior rigor, digamos assim, quem seria, por exemplo, talvez eu ou alguém do STJD, um civil, para fazer um inquérito ou até mesmo uma inquisição? Não teria a qualificação, e eu tenho muitas dúvidas se, legalmente, poderia ser exercida esse tipo de atividade.
Carlos Portinho: É verdade. Então, muito esclarecedor, inclusive uma informação que a gente não tinha: mais de 200 casos de alertas de suspeitas de manipulação, em cinco anos passados – de 2017 a 2022 -, que foram para o STJD e de que a gente não teve nem conhecimento, nem na imprensa. Estou até curioso em saber. Isso eu posso oficiar ao STJD, para saber se esses alertas… E pedir a cópia deles? Eles têm lá?
Rômulo: Senador, o senhor pode, talvez, solicitar à própria Diretoria de Competições da CBF, que a correspondência saía… Não saía diretamente do Rômulo Reis, saía do departamento de competições através da secretaria, como qualquer despacho administrativo.
Carlos Portinho: Vou pedir para a minha assessoria já preparar esse ofício, Senador Kajuru, tanto para o departamento de competições quanto para o STJD, para que informe a essa CPI, a nós aqui, e traga a cópia desses alertas. Não vou nem dar o número, acredito que sejam em torno de mais de 200, o que é espantoso, mas que eles nos encaminhem todos os alertas que foram encaminhados, nesse período de 2017 a 2022, ao STJD. Porque em 2023 a gente sabe que são 109 e em 2024 a gente já tem uns casos aí. Eu até estou pedindo – já fiz um outro requerimento, já foi aprovado – para saber quantos alertas tem este ano. Eu sei que em um caso, pelo menos, a própria CBF se antecipou junto com a Polícia Federal.
Em 2023 109 alertas de suspeita de manipulação pela sportradar. Agora em depoimento de um ex oficial de integridade da CBF fomos surpreendidos ao saber que no período de 2017-2022, qdo la trabalhou, mais de 200 Alertas foram enviados a época pela CBF ao STJD … e nada?!! Quais…
— Carlos Portinho (@carlosfportinho) July 9, 2024