CEO do Botafogo desde março, o economista Jorge Braga é um dos pilares da nova gestão, comandada pelo presidente Durcesio Mello. O executivo vem promovendo mudanças internas no clube, realizando ajustes e readequando a parte financeira. Ele deu entrevista ao jornalista Mauro Cezar Pereira, nesta quinta-feira, no quadro “Dividida”, do “UOL”.
Jorge Braga detalhou seu início no clube e as mudanças promovidas. O principal norte é produzir mais com menos.
– Passei 30 dias escutando e falando com todo mundo para ter um diagnóstico o mais isento possível. A vantagem de vir de fora é não ter a paixão do futebol na hora de olhar o que é bom e o que é ruim. Meu diagnóstico estava correto em relação às finanças, o clube só tinha caixa para mais algumas semanas. O que vislumbramos seguimos fielmente. Há uma gestão muito forte de corte de custos e despesas, reorganização da casa, estruturar a dívida e buscar investimentos. Continuam sendo as quatro premissas básicas para o Botafogo atravessar 2021 e buscar a Série A, de onde nunca deveria ter saído – explicou Jorge Braga.
– Como em qualquer gestão ou projeto desafiador, o primeiro passo é transparência. O Botafogo colocou na rua um balanço sem ressalva de auditoria pela primeira vez em muitos anos. Era uma degradação acelerada das contas, a queda para a Série B prejudicou em quase R$ 100 milhões, entre direitos de transmissão, patrocínio e sócio-torcedor. Nosso produto é futebol, quando ele sofre, o negócio sofre. Mas temos conseguido reverter esse quadro. Fizemos aprovação de planos de metas estratégicas até 2024. Para ter ideia, esse ano, cumprindo o orçamento à risca, apesar de ter receita R$ 70 milhões menor vamos entregar resultado R$ 70 milhões melhor, o que é uma resposta inequívoca da melhoria da gestão. Não é só questão de números, todos os processos de gestão, inclusive do futebol, avançaram. Isso não começou quando cheguei em março, veio no início da gestão, que tem objetivos claros e vem cumprindo. A própria estrutura de vice-presidentes é menor. A ideia é tornar a gestão profissional – disse o CEO, antes de dar detalhes específicos.
– Vemos coisas do sentido de fazer mais com menos. Reduzimos as despesas em 40% no futebol feminino e ainda assim fomos campeões femininos. No Sub-20 houve redução importante de receitas, somos o quarto lugar (no Brasileiro) e fomos vice-campeões (Copa do Brasil). No remo fizemos cortes importantes e tivemos uma campanha gloriosa do nosso remador (Lucas Verthein). Com gestão você consegue fazer muito mais com menos. Temos olhado no ponto de vista de contratação de jogadores, existe uma ciência por trás disso, valuation e scouting. O Botafogo tem que fazer melhor sua gestão de ativos, a formação de atletas é muito forte, deveria rentabilizar melhor isso, tanto rendendo atletas para o Botafogo como para outros mercados mundiais. Isso percebemos da mudança de gestão. Sem contar aspectos muito técnicos, centralizamos todos os processos de fornecedor, compra, pagamentos, recursos humanos. Mesmo em relação o valor de folha, achamos a relação folha e performance muito melhor. A folha era de R$ 4 milhões em fevereiro, hoje é de R$ 2,8 milhões com desempenho esportivo muito melhor. Acreditamos que com ciência, gestão, métricas e cobranças, até o futebol consegue fazer mais investindo um pouco menos – acrescentou.
Como exemplos da nova mentalidade, Jorge Braga citou o modelo de contratações, bem diferente do anterior.
– A primeira coisa que precisa mudar é a cultura, uma mudança profunda, e tem acontecido. Há a cultura mundial de comprar atleta na alta e vender na baixa. A expectativa é trazer ídolos prontos. Isso não funciona. Até o Barcelona teve dificuldade de renovar com sua maior estrela. Contratamos uma consultoria de scouting para acelerar e transferir conhecimento para o clube, estabeleceu indicadores e padrões, até para comprar e vender jogadores, saber o valor justo. Outro ponto é o comitê de futebol, um grupo que discute todos os temas, quem traz, como traz, com que valor. Outra coisa muito evidente, o (Eduardo) Freeland é bom gestor, tem boa cabeça, temos discussões de scouting, orçamento, custos e despesas. Diferente das culturas anteriores de traz a qualquer custo e depois vê como paga. Apesar de toda a dificuldade financeira, temos conseguido manter os salários em dia. Hoje temos folha menor do que em fevereiro e resultado maior. Esses indicadores nos dão certeza de que estamos indo no caminho certo. Não se muda uma história de décadas de repente. Temos feito muita coisa, mas mudança de percepção demora mais que os fatos. Nossos indicadores têm apontado para melhora expressiva, mas isso tudo tem que suportar nossa subida para a Série A, que é o objetivo desse ano – comentou.
Por fim, o CEO do Botafogo explicou a declaração de “buscar o quarto lugar na Série B”, dada antes do início da competição, e projetou mais investimento em 2022.
– Um dos meus objetivos é estabelecer expectativa. Quando cheguei, ainda era muito parecida com a de outras gestões, faça qualquer coisa, ganhe o título, depois vemos como fazemos. É claro que ninguém quer só o quarto lugar, mas qualquer um dos quatro lugares é o que precisamos para ter acesso. Entendo, respeito, também sou torcedor e gosto de títulos. Mas cabe uma discussão: o modelo de negócios do futebol está mudando no mundo e acelerando no Brasil. Para concorrer a primeiro e segundo lugares, o nível de investimentos em atleta tem que ser o dobro ou triplo. O modelo de negócios é muito alavancado e pouco eficiente para os que disputam as primeiras posições, exceto se tiver uma concentração de receitas de transmissão muito grande. Temos que pensar no que é viável para o Botafogo. Brigamos para ser campeões, mas fazendo as contas friamente, nosso objetivo para o ano que vem é subir com responsabilidade. Voltando para a Série A são R$ 70 milhões a mais, talvez R$ 100 milhões, porque vem patrocínio, sócio-torcedor aumenta, licenciamento. Aí sim conseguimos colocar a casa em ordem e voltar a fazer investimentos conscientes para brigar por títulos. A expectativa de 2021 é sobreviver e obter o acesso em uma das quatro posições – finalizou.