* Sem a pretensão de querer dar a opinião de toda a torcida ou ensinar um técnico renomado sobre futebol, esse texto aqui é uma carta aberta a Bruno Lage (que dificilmente será lida pelo treinador). Bruno, nós queremos o mesmo que você: o Botafogo campeão, os jogadores sendo exaltados, o trabalho sendo reconhecido. Esse sonho é de todos nós.
* Nas últimas entrevistas, temos sentido um tom de distanciamento seu, como se houvesse várias partes: você, o elenco, a torcida, a diretoria. Esse é um dos pontos: hoje somos a família Botafogo, e você faz parte dela. Tenha certeza disso.
* Quanto a críticas e vaias, talvez não tenham lhe falado, mas o futebol brasileiro é assim. O torcedor brasileiro é assim, impaciente, imediatista, emocional. Basta ver a frase recente de seu conterrâneo Abel Ferreira: “A única equipe no Brasil que não está em crise é o Botafogo”. Nesse sentido, todos são contestados o tempo todo. É preciso se acostumar e se blindar das opiniões externas.
* O torcedor entende (não gosta, mas entende) a eliminação na Copa Sul-Americana, se foi pensando no objetivo maior do título no Campeonato Brasileiro. O torcedor entende mudanças na equipe, sofrer mais gols, fazer mais gols, ter um novo processo de adaptação. Mas ajude o torcedor a entender melhor. Se a Sul-Americana vai ser deixada de lado, avise aos botafoguenses do planejamento. Se há mudanças no time por questões físicas, uma comunicação clara colabora.
* Até mesmo uma derrota em clássico é possível compreender. O que não é compreensível é o lado direito com JP Galvão e Matías Segovia contra um lado esquerdo do Flamengo que tem Ayrton Lucas, Gerson e Bruno Henrique. Todo mundo sabe que aquele setor é o mais forte do adversário. E por ali o jogo foi perdido.
* O que houve com Di Placido? Não fez sentido a não escalação do lateral que jogou praticamente o campeonato todo e vem crescendo de produção. A não ser por uma questão médica ou física não divulgada. Menos sentido ainda a dobradinha JP Galvão e Segovinha.
* JP Galvão era um volante no sub-20 do Vasco, sem brilho, a ponto de ser emprestado para o Botafogo, onde vem se transformando em lateral-direito. Nada contra o garoto, que até está evoluindo, muito pelo contexto em que está inserido, mas claramente não está pronto para um clássico Botafogo x Flamengo. Menos ainda para marcar Bruno Henrique. A diferença física e técnica fez o duelo parecer de um profissional contra um jogador de divisões de base.
* Em vez de ajudar JP, você acabou enfraquecendo o setor, Bruno. Primeiro ao tirar Tchê Tchê, que tem mobilidade, se desdobra em campo e gosta do lado direito. Segundo, ao colocar Segovinha, que é outro jogador que ainda não está pronto para o profissional. O paraguaio não tem a capacidade física de disputar duelos defensivos em alta intensidade e em fazer a recomposição o tempo todo, ainda que tenha boa técnica para jogar. Rende melhor entrando na segunda etapa em jogos específicos.
* Ah, mas quem marcaria Bruno Henrique? Contra esse tipo de jogador, o melhor é fazer é “encaixotá-lo”, tirar o espaço a seu redor com vários jogadores, fazer com que solte a bola. Não é tarefa para apenas um defensor, menos ainda se for um jovem improvisado disputando seu primeiro Campeonato Brasileiro.
* Você sabia que Luís Castro já cometeu no ano passado o erro de querer que esse Botafogo seja propositivo o tempo todo? Jogando assim, passou por momentos delicados e derrotas duras, como goleada para o Palmeiras e atropelo para o América-MG na Copa do Brasil, entre outras. Aliás, sabia também que Castro tentou um meia-direita jogando de extremo, em vez de um jogador de velocidade? Foi Gustavo Sauer, foi Chay, foi Lucas Piazon. Não deu certo.
* Não repita esses erros de Luís Castro. Vale aproveitar essa pausa da Data-Fifa para rever o que tem de bom esse Botafogo. Uma solidez defensiva, com Lucas Perri, Adryelson e Victor Cuesta como pilares, laterais leves que marcam e apoiam (Di Placido e Hugo, Marçal caiu um pouco de produção mas é importante) um meio-campo forte, combativo e competitivo, a partir de Marlon Freitas e Tchê Tchê, pontas de velocidade e intensidade que se revezam, como Victor Sá, Luis Henrique, Júnior Santos, Carlos Alberto e Segovinha (este mais técnico, para segundo tempo), eficiência e qualidade na frente com Eduardo e Tiquinho Soares. Um jogo de imposição física.
* Esse Botafogo não tinha vergonha de se defender postado mais atrás, de acelerar nos contra-ataques, de buscar gols na bola parada. Hoje o time se posiciona com linha alta e fica exposto a lançamentos em profundidade, troca passes quando poderia acelerar transições e não tem sido eficiente pelo alto.
* Entendemos perfeitamente quando você diz que conversou com os jogadores e eles próprios sinalizaram ideias de mudança, para evoluir. Mas, por ora, faça o simples. O Botafogo tem uma forma que o levou à liderança isolada do Brasileirão, reconquistou a torcida e o fez ganhar elogios da imprensa. Aposte nela. As mudanças deixe para o ano que vem, com pré-temporada e tempo para treinar.
* Ah, e esqueça essa ideia de entregar o cargo. O Botafogo apostou em você, John Textor confiou em você, seu currículo fala por si só, sua elegância, os elogios que recebe no mundo da bola. É com você que o Botafogo quer ir atrás desse título. E, pode ter certeza, a torcida vai continuar indo junto, como mostrou com a recepção no aeroporto e com o apoio mesmo após a derrota no clássico.