Minutos após a entrevista na sala de imprensa do Botafogo, Dória pega o celular e começa a ler as mensagens dos amigos no chat de seu aparelho. O pai, seu Hélio, comenta que a maturidade do filho o impressiona. Oswaldo de Oliveira o vê pronto para ganhar experiência numa Copa do Mundo, pondo assim em prática um talento precoce para muitos anos de seleção brasileira. Com casamento marcado para o próximo dia 11, o próprio jogador alimenta, mesmo que discretamente, a chance de ser convocado novamente para a Seleção principal na próxima quinta-feira pelo técnico Felipão, para os amistosos contra Coreia do Sul e Zâmbia, em outubro. Uma nova oportunidade representaria a manutenção do sonho de jogar o Mundial de 2014 no Brasil com apenas 19 anos, fato raríssimo para zagueiros.

Zagueiro Dória lê as piadas que recebe de amigos no chat do celular (Foto: Raphael Zarko)
Apesar de todos predicados do primeiro parágrafo, de dividir a zaga de um dos times mais regulares do Brasil com o experiente Bolívar, que será seu padrinho de casamento, Dória é apenas um garoto. O celular na mão serve também para receber, ler e repassar as piadas para o pai, companheiro inseparável de todos os treinos, e para os amigos. Mas o zagueiro revelado no Botafogo tem a responsabilidade de defender o time que sonha tão alto quanto o garoto de Niterói, que se decidiu pela “hora certa” de casar e pelo momento errado de sair do país.
Com naturalidade, ele fala de seleção brasileira, de propostas de fora do país e da luta do Botafogo pelo título brasileiro, apesar da distância de sete pontos para o Cruzeiro. Contra o time mineiro, na derrota por 3 a 0 na última quarta-feira, o zagueiro botafoguense estava suspenso pelo terceiro cartão amarelo. Diante do Bahia, no Maracanã, às 16h, deste domingo, ele volta.
– Conheci minha atual namorada na escola, há três anos, quando ainda não jogava no profissional – conta ele, que estreou nos profissionais com 17 anos e, talvez sem perceber, comenta na entrevista que ainda era da base, como se fosse possível atuar no time de cima com apenas 15 anos.
Segundo Dória, a tranquilidade que aparenta fora de campo é uma mistura do bom momento que vive no Botafogo, das boas companhias no clube – ele cita Jefferson, Bolívar e Seedorf como influências positivas para sua carreira – e do apoio da família.
– Decidi me casar porque já sei que ela vai ser a minha mulher para a vida inteira. Sinto-me bem com ela e acho que é a hora certa de fazer essa escolha e de ter uma família junto com ela. Não sou de sair mesmo, sou caseiro, sou mais família, então vai ser bom para ficarmos mais juntos – diz o garoto, que ainda não pensa em filhos.
– Ainda não, vamos casar porque essa é a nossa vontade, de ficarmos juntos.

Para o pai, seu Hélio, Dória tem mentalidade de homem de até 35 anos (Foto: Raphael Zarko)
Se nos últimos tempos o Botafogo perdeu Vitinho, de 19 anos, numa das primeiras ofertas do futebol europeu, Dória preferiu esperar mais. Com os mesmos empresários desde os 13 anos, ele também se aconselha muito com os mais experientes do Botafogo e com a família.
– Quando chegaram as ofertas, meus empresários me passaram o que ia ser bom, o que ia ser ruim, e eu decidi ficar. Aqui me sinto em casa, me sinto feliz, tenho tranquilidade para trabalhar e só preciso me preocupar com o futebol – lembra ele, que rejeitou proposta mais forte do futebol russo recentemente. – Acho que o momento seria difícil (para sair). Até para verem meu futebol, até mesmo para adaptação, não é o momento ainda. Quando for a hora disso acontecer, vai estar na cara. O clube mesmo vai falar, se for bom para mim, para o clube, para a família, todos vão saber o que é melhor.
Enquanto isso, Dória tem um título e uma Copa do Mundo para mirar. Ele reconhece a forte concorrência pela quarta vaga, levando em conta que Thiago Silva, David Luiz e Dante são nomes certos de Felipão. O zagueiro botafoguense cita Dedé, Rever e Henrique como prováveis concorrentes. E ganha o apoio de Oswaldo de Oliveira.
– Acredito na convocação dele para a Copa, acho muito possível. Seria uma prática muito interessante, caso decidissem por levar um zagueiro jovem. Mas é claro que há outros jogadores disputando a vaga. Mas se acontecer vou ficar muito feliz – diz Oswaldo.

Dória conversa com Seedorf e Oswaldo durante treino: aposta para 2014 (Foto: Fred Huber )
A maior lembrança do garoto de Copa do Mundo é de 2002, dos gols de Ronaldo na madrugada japonesa contra a Alemanha. Dória, aos oito anos, acordava de madrugada para ver as partidas e já se destacava no futebol de salão. Um dos companheiros de time dele, naquela época, já era consagrado: Seedorf. Hoje, o holandês até ouve conselhos do garoto para voltar à sua melhor forma.
– Tenho muita liberdade para falar o que eu quiser com ele. Seedorf vem me ajudando todo dia na minha evolução, em questão de posicionamento. Um cara campeão e que só tem a acrescentar a mim e também para o grupo inteiro. Ele sabe que pode ajudar a gente mais. Ele mesmo está se cobrando isso. A gente já conversou e ele sabe que isso acontece com todos jogadores. Mas com certeza vai dar a volta por cima e nos levar juntos nessas rodadas que faltam – diz o garoto, que impressiona o pai pela maturidade.
– A gente diz que ele com 18 anos parece que tem a mentalidade de 30, de 35 anos. Nas atitudes, no jeito dele agir, é sempre assim. É impressionante – diz seu Hélio.