Encerrado o clássico com o Fluminense, Eduardo Barroca, o técnico que assumiu um Botafogo que cumpria temporada paupérrima, poderia exaltar seus dotes de estrategista.Afinal, tem quatro jogos à frente do alvinegro com três vitórias e uma marca admirável: a coragem de tentar mudar um jeito de jogar que já era parte da cultura do clube. Acabara de sair de um duelo que o obrigara a fazer concessões às suas convicções, de tão boa que fora a atuação do Fluminense. Mudou a estratégia e venceu.
— A comunidade do futebol precisa bater palmas para o (Fernando) Diniz. Não pensamos em jogar retraídos, no contra-ataque. Tentamos pressionar e eles conseguiram sair — disse Barroca sobre o colega.
O jogo opôs dois técnicos que pensam o futebol de forma arejada, retrato de uma edição de Campeonato Brasileiro mais diversa taticamente. A clareza de Barroca para tratar do duelo tático do jogo mistura a nobreza de reconhecer virtudes do rival com a lembrança ao público de que nem toda postura num campo de futebol é escolha. Por vezes, há imposição do rival. A intenção dos dois era jogar, mesmo com elencos que, em teoria, não colocam Fluminense e Botafogo como candidatos à parte alta da tabela. O clássico agradável de ver reforçou motivos para respaldar as ideias de Diniz e Barroca.
Ocorre que a vitória alvinegra num clássico em que o Fluminense foi melhor, embora deixe os times em situações opostas na tabela, os une num aspecto: ambos terão o futuro profundamente impactado pela forma como se pensa futebol no Brasil.
Os nove pontos em quatro rodadas dão ao Botafogo mais do que conforto na tabela. Oferecem crédito a um treinador jovem para insistir em sua ideia de ser protagonista dos jogos, ter iniciativa, algo diferente do que o Fluminense o obrigou a fazer. Não é simples. O Brasil só aceita dar tempo para que tais projetos prosperem com vitórias.
Este Botafogo ainda sofre ao pressionar o adversário: porque não tem um meio-campo tão ágil e porque sua linha defensiva, que não é tão rápida, por vezes se posiciona muito atrás enquanto o time se adianta, criando espaços. O Botafogo irá tropeçar ainda no processo de implantação do modelo de Barroca. Quando ocorrer, o desafio será entender que o modelo que derrotou o Fluminense foi uma adaptação a uma circunstância diante de um adversário com trabalho um pouco mais longo, embora também embrionário.
Quanto a Diniz e ao Fluminense, o que se apresenta é um teste de convicções. O treinador não parece dado a sucumbir ao resultadismo. Clubes costumam ser o oposto.
Séries de tropeços costumam ser um convite à desconstrução de personagens, especialmente os que propõem algo ousado. Afinal, o conservadorismo oferece uma falsa sensação de segurança. Como se o Fluminense dos últimos anos não tivesse flertado com o desastre. Agora, chegarão a Diniz teses recheadas de sofismas e enganos, “sugestões” irracionais de que o “jogar bem” não conduz a resultados ou tentativas de relacionar posse de bola a derrotas.
O Fluminense tem carências no elenco e, de fato, a evolução do time parecia ter travado. Nestas horas, tendemos a condenar a ideia de Diniz no lugar de julgar erros e acertos na execução dela. Nos jogos recentes, o tricolor fez sua posse gerar mais chances, colocou-se mais perto de ganhar. O atual drama é uma fragilidade nas duas áreas: para um time que por vezes defende mal o seu gol, a falta de contundência na finalização custa caro.
Não é por pregar um futebol atraente que Diniz deva estar imune a críticas. Mas o jogo que propõe envolve um processo de implantação. Foi o caminho que o Fluminense escolheu, e o jogo de sábado reforça motivos para lhe dar tempo. Vez ou outra, já surgem atuações para desfrutar, e a torcida pareceu ter comprado a ideia. A arquibancada é sábia.